quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Quando os bancos perderem o sentido

Usar valores em dinheiro em troca de mercadorias e serviços é muito melhor que ter que negociar usando apenas mercadorias que você possua ou serviços que você possa prestar. E ganhar acesso a descontos ou benefícios exclusivos por ser um cliente fiel a uma marca ou cartão de crédito já é um passo além das meras transações com dinheiro eletrônico disponível ou emprestado a juros. Porém a humanidade já reúne condições para avançar para além do sistema monetário, prescindindo do dinheiro e dos bancos para assumir o uso exclusivo do Capital Prerrogativo.

Imagine um mundo em que o acesso de todas as pessoas ao mínimo necessário para suas sobrevivências seja garantido "gratuitamente" em troca da privacidade de seus dados pessoais de consumo e cheios de anúncios (principalmente de práticas em favor de alguma marca, de serviços a serem feitos e das incríveis recompensas por aderir a algum desses contratos). Nesse mundo, muita gente poderia escolher viver sem trabalhar, dormindo em alojamentos comunitários, tomando banhos cronometrados em vestiários públicos, comendo à vontade alimentos industrializados ou rejeitados nas feiras, usando o transporte público, e assistindo à programação dos canais abertos nas telas de algum auditório ou acessando vídeos e outros conteúdos em quiosques digitais.

Porém, é muito provável que boa parte das pessoas preferisse acumular pontos e conquistas ao participar de cursos ou aceitar tarefas, para poder carregar suas próprias telas no bolso das roupas sem estampas de propaganda que elas mesmas escolheram. E com um pouco mais de sacrifício poderiam ter acesso permanente, sem necessidade mensal de juntar e pagar um aluguel, a uma cabine reservada para fazer o que quiser sem nenhuma câmera de vigilância publicando sua vida na rede. Talvez até conquistarem o direito de pegarem emprestado veículos comunitários e dirigí-los para onde quiserem. Também poderiam querer ter seus próprios armários refrigerados com tranca biométrica para acumularem suas doses únicas diárias de bebida alcoólica (distribuídas como remédio preventivo de doenças cardiácas a ser tomado durante uma refeição) e poder tomar um porre ou fazer uma festinha de vez em quando.

É claro que a qualquer infração cometida pelo sujeito e comprovada pela vigilância ou pelo monitoramento de seus registros de acesso biométricos, ele poderia perder alguns de seus acessos conquistados, podendo recuperá-los com algum esforço. E no caso de crimes graves, poderia até perder o acesso a clubes e condomínios e ter sua vigilância e monitoramento reforçados (com tornozeleiras e restrições de acesso), podendo recuperar suas liberdades ao participar de reuniões de aconselhamento, aulas de cidadania ou pela prestação de serviços comunitários (como embelezamento urbano e campanhas cidadãs).

Haveria também um sistema de transferência coletiva de pontos ou conquistas para apoiar projetos pessoais divulgados em redes sociais, além do apoio de voluntários em tarefas programadas pelo autor do projeto para sua realização. A transferência coletiva também poderia servir para premiar periodicamente os responsáveis pelo melhor serviço público à comunidade (por exemplo, a praça mais bem cuidada ou o motorista mais gentil).

Por enquanto é essa a utopia viável, apesar de ainda faltar definir quem programaria o "código aberto" dessas cidades-empresas, e quem regularia as falhas de mercado (monopólios naturais, etc), embora uma possível proposta política seja a de atomizar os três poderes (legislativo, judiciário e executivo) nas mãos de todos os cidadãos. E o que fazer com o monopólio estatal sobre a violência (e a "guerra justa")? No fim das contas a Revolução Prerrogativa seria a união da Economia com o Direito, e a unidade de valor passaria a ser o merecimento conquistado (com pitadas de Gamification).

Nenhum comentário:

Postar um comentário